Tínhamos saído do outono americana, de 5-10 °C para um calor infernal. A quantidade de pessoas era incrível e só o pouco tempo que levamos do avião até a van, notei a poluição daquele ar. Veja bem: eu nasci e fui criada em uma cidade do interior e nem ao menos havia visitado Nova Iorque, então acreditava que São Paulo devia ser tão grande quanto, e com a poluição normal de uma metrópole. Mesmo assim, vista de cima, não havia nada parecido com o Central Park, o que fez eu me sentir ainda mais deslocada.
De qualquer forma, chegam à van e ao ar condicionado. Assim que tive uma chance na caminhada de falar só com Lemmy, o fiz, pois estava preocupada.
-Aqui também há semideuses? E monstros? Se nós dois somos semideuses e você é tão famoso, não corremos perigo?
-Não se preocupe mocinha, temos tudo sob controle. – Ele apontou para o para-choque de frente da van, e quase dei um pulo quando percebi que tinha a cor de bronze. – E nosso motorista, apesar de ser mortal, sabe de tudo. Não teremos problemas.
Resolvi confiar, e aproveitar os petiscos dentro da van, enquanto ouvia-os tocar, e às vezes pedia uma música deles mesmos (Achei furtivamente um álbum da banda no avião e decorei alguns nomes de músicas), ou até músicas de outras bandas de rock.
Chegamos ao hotel e não sabia seu nome. Minha dislexia não facilitava muito, nem as letras cursivas e muito menos o fato de estar escrito em português, aquilo era um pesadelo em forma de palavras.
Lá, nos hospedamos na cobertura, obviamente. Ela comportava tranquilamente nós 5, com bastante sobra. Eu não estava acostumada com tanto luxo, mas ali ele tinha tudo de melhor. Era incrível. Quando fui à janela, percebi que podia ver uma boa parte da cidade dali, e imaginei o quão grande deveria ser, se eu pudesse ver ela inteira. Era uma metrópole caótica como qualquer outra e realmente não tinha uma arquitetura admirável, mas por outro lado, o povo não parecia tão ruim, pelo menos os fãs do Lemmy não. Imaginei que deveria haver lugares piores, como a China, por exemplo, mas estava bem no ar condicionado do quarto, da van e de qualquer lugar que fôssemos ficar, pois não queria respirar aquele ar nunca mais.
Depois de tomarmos banhos longos, fomos almoçar. Não me pergunte por que alguém serviria almoço já tão tarde, pois já passava das 14 horas, mas mesmo assim, fomos a uma churrascaria com rodízio de carnes que só recebia nós 5 e mais alguns membros da staff da banda. Comi bem, mas me incomodei com Lemmy. Ele olhava muito para mim, me analisando, o que fazia eu me perguntar o que eles faziam quando Ryan estava ali. Será que eu não estaria agradando eles? Tentei tirar isso da cabeça e me distrair. Doro resolvera ficar do meu lado desde que acordei no avião, e eu me sentia bem por isso. É claro que uma garota de 13 anos se sentiria incomodada no meio de três homens metaleiros, então a presença dela me fazia muito bem.
Depois de almoçarmos e passarmos bastante tempo na churrascaria fazendo piadas, conversando e cantando, fomos embora para o hotel novamente, e foi aí que aconteceu a coisa mais estranha até então.
Tentávamos voltar para o hotel naquele trânsito caótico, mas nosso motorista conseguiu achar uma estrada alternativa sem movimento, o que eu não entendo como seria possível. Como diabos aquelas pessoas não a viam? Estava tão na cara que era melhor transitável, mas cheguei à conclusão de que ou eles não a viam, ou tinha algo de errado nela. Depois de um tempo nessa via, notei que muito a nossa frente, uma forma escura e enorme estava vindo na nossa direção. Reparei até conseguir identificar, e não tive dúvidas, pois era o mesmo de meu sonho: um enorme minotauro.
Arregalei os olhos e abri a boca para falar, mas Lemmy percebeu e me cutucou rapidamente, piscando o olho para mim. Isso me fez ficar confusa por tempo suficiente até a criatura estar a 10 metros de nós, e então... Puff. A van se chocou com o monstro, mas não parou. Quando olhei para o vidro de traz, não havia monstro nenhum. Não sabia se eu estava vendo coisa acordada, ou se aquela van era realmente uma máquina de matar monstros. Se fosse, queria uma pra mim quando fizesse 16.
Passamos mais tempo na cobertura do hotel, cantando bastante e falando besteiras. Até aquela hora eu já me sentia mais solta e conseguia conversar bastante e interagir com todos, e quando eu já estava até feliz de estar ali, o tempo parecia voar, pois Lemmy levantou e anunciou: -É hora do show!