Os sonhos dos semideuses tem uma característica interessante. Nunca são apenas sonhos. E por isso, o medo foi muito mais intenso quando o filho de Afrodite acordou. A maioria dos servos de Éris vive sem medo nenhum, eles encaram as situações mais caóticas com frieza e até diversão, mas jamais com pavor. Porém, ao abrir os olhos naquela noite o garoto viu seu coração bater rápido o suficiente para ameaçar sua vida. Ele sentia as mãos esqueléticas e duras de Tânatos apertando seu peito, o sorriso esquelético da morte tornando sua vida insignificantemente vazia.
Por mais ameaçador que tenha sido seu sonho, o garoto pouco se lembrava dele. Via flashes se repetindo em sua cabeça enquanto tentava se lembrar. Mas a única coisa concreta, era o som de correntes balançando enquanto uma canção de ninar era tocada ao fundo.
Foi difícil recuperar o fôlego, e quando estava finalmente voltando ao normal, o susto retornou ao som de um cumprimento.
- Olá.
Virando-se bruscamente, Henry viu uma garota sentada ao lado da sua cama. Não era linda como uma filha de Afrodite, mas ainda assim era muito bonita. Pele clara, cabelos ruivos e longos, e uma voz muito doce. Porém, o que chamava mais atenção nela eram seus olhos brancos e leitosos encarando o vazio e refletindo de forma tênue a luz esbranquiçada da lua.
- Sabe me dizer onde encontro uma razão para viver?
Essa certamente era a pergunta mais estranha a ser feita em uma madrugada para um desconhecido. O vento entrou pelas janelas, congelando o corpo suado do campista. Um vislumbre de escuridão em sua mente afogava seus pensamentos. O garoto sentia-se em perigo.
Aquela garota parecia ter sua idade, e embora a abordagem misteriosa, ela não parecia uma Deusa. Não, certamente havia humanidade nela, e talvez isso que aguçasse os sentidos do filho de Afrodite. Mas o que ela fazia ali? Naquela hora?
As únicas respostas, eram os trovões lá fora, as nuvens escuras da tempestade que contornavam o luar mas não o ofuscavam. De repente, Urano e Gaia se unem ao som do aplauso da chuva. Todos estavam dormindo, tudo estava em silêncio, mas ainda assim, estava tudo muito caótico.
“Hoje é domingo” lembrou-se Henry, mas ele não sabia o porquê de isso lhe parecer tão importante. O medo retornou, mas dessa vez ele se sentia melhor, como um caçador se sente diante do urso. Sua mão tremeu, ele engoliu seco e respirou o ar úmido e gelado. Por algum motivo, ele sentia que ainda não estava acordado. Talvez, nunca tenha estado.
O medo retorna. Uma estranha agonia rasga-lhe as costelas. Seu sangue está frio. O mundo está se movendo mais rápido. E de repente ele percebe, que enquanto seus pensamentos se perdiam em mil variantes, ele não havia por nenhum segundo, tirado os olhos da garota.