O campo de batalha tem um cheiro único. É úmido, parece ferrugem e é tomado por um falso calor. Os filmes não contam isso, mas, uma guerra com mais de 200 homens em cada um dos exércitos não termina em duas horas... Não, na verdade, demora pelo menos três dias até a vantagem numérica surgir em um dos lados e uma nação sobrepujar a outra.
Até lá, você consegue perceber as características que só existem em um lugar com pessoas batalhando. Num primeiro momento você percebe o porquê das pessoas descobrirem que existe ferro no sangue antes mesmo de terem noção de que aquilo é um elemento, afinal, o cheiro e o sabor são identicos.
O calor é a principal das mentiras. A não ser que a guerra seja travada dentro de um corredor apertado - nada másculo, diga-se de passagem - sangue quente perde rapidamente a sua temperatura com o vento, e se você parar de se movimentar, o metal da armadura absorve todo o calor do seu corpo e te lembra do casulo gélido que te cobre.
Não é um lugar bom, ninguém quer estar ali. Basta estar no meio de um campo de batalha para perceber que as histórias de homens que adoravam estar ali, eram uma mentira deslavada contada pelos vencedores. O próprio Perseu certamente deve ter mijado nas calças umas duas vezes, e Aquiles já pensou em largar o escudo e deixar a lança por um fim à incerteza daquelas lutas.
E Lorenzo sabia disso. Não que tivesse passado por muitos campos de batalha, não, ele era um adolescente filho do Deus da Guerra, mas, tirando esse detalhe a única guerra que viu de verdade, sem homens lançando poderzinhos e sem roupinhas coloridas, foi quando viu um filme aleatório sobre a idade média. Mas, as memórias dos seus antepassados romanos ferviam no seu sangue. Numa guerra, algumas pessoas morrem, outras sobrevivem, mas nenhuma delas queria estar ali.
E, assim como os guerreiros nunca querem estar num festival de cadáveres quentes, ele não queria estar ali naquele momento, com Marte pisoteando a sala dos pretores, andando de um lado para o outro sem falar nada.
Normalmente o Deus da Guerra parece um motoqueiro que visita bares no meio da estrada, mas, naquele dia parecia um jovem romano de 40 anos com uma armadura imperial completa, vestindo até mesmo o chamativo elmo com plumas. A figura de Marte era assustadora, havia algo vermelho e com garras dentro dele, que gritava aos instintos de Lorenzo para fugir. Mas não importa para onde fosse correr, não poderia escapar daquele olhar.
O Deus parou de andar, fitou o pretor e disse: - Decidi. Você se tornará um soldado de verdade. - Era estranho ouvir isso, afinal, Lorenzo é considerado um dos maiores guerreiros de Roma. - Você precisa aprender a se virar num campo de batalha. É sua puberdade, afinal. - Tentou encontrar ironia nas palavras de seu pai, mas a busca foi em vão. - Olha, tem um aprendiz meu que pode te ensinar algumas coisas. Mas, antes, você precisa ir encontrar com ele. - Marte se aproximou de Lorenzo e tocou seu ombro. - Você precisa se tornar um homem de verdade, filho.
Não havia deboche em sua voz, apesar da situação parecer bem ridícula, o Deus da Guerra realmente parecia orgulhoso falando aquilo. E, depois de algumas palavras motivacionais que mais pareciam ofender ao seu filho, Marte falou: - Síria. Procure o Major Donald. - Sem detalhes, o Deus virou as costas e desapareceu.
Parece que o pretor tinha uma missão inesperada.