Aquela altura, pouca coisa, ou quase nada, me fazia sair do submundo.

Desinteressado pelo mundo aqui fora, eu me tornada, cada dia, mais como um Hades em miniatura. Minha pele era tão pálida que parecia nunca ter sido beijada por raios solares. Olhos profundos, de olheiras por um relógio biológico desregulado que não conseguia diferenciar dia de noite embaixo da terra, e assim podia ficar por até uma semana inteira, ou quase, sem dormir. Não era como se eu me sentisse cansado. Cercado de tanta escuridão. Na verdade, exatamente o oposto. Contudo, embora houvesse divino em mim, eu ainda era humano, com necessidades fisiológicas.

Tanto fazia, toda essa divagação. Só o que importava era que eu gostaria de terminar aquilo logo, para voltar para o submundo. Ou para o meu chalé, dormir um pouco. Havia me arrependido de ter saído da minha cama assim que o portão atrás de mim, da arena, tinha se fechado. Agora só se abriria novamente se eu terminasse com os meus inimigos. Ou eles terminassem comigo.

Heh, quem eu estou enganando?

Assim que as primeiras plumas me acertaram, meu impulso natural foi esticar o braço e invocar, imediatamente, minha espada longa feita inteiramente de ferro estígio. Contudo, percebi que aquela briga não era deste tipo. Não se pode trazer uma faca para uma luta de armas. E então sorri. Olhei para o alto, e, com um comando mental, percebi um sorriso por de trás das nuvens. Mesmo que não pudesse ver.

Pelo menos uma tonelada e meia de pura escuridão descia dos céus, cuspindo trevas oriundas de um coração fiel, embora temperamental, digno de um guardião como o próprio Cérbero. Fenrir cuspia morte nas criaturas no meio da arena, tanto que seria difícil não ser atingido. Contudo, eu não poderia deixar barato. Mexer com o Príncipe do Submundo não era boa ideia, e eles precisavam saber. Todos precisavam saber. Que a morte viria de todos os lugares. E, por isso, abaixo dos seus pés, uma fenda se abria, puxando-os, vorazmente, para as profundezas do Tártaro.

Olhei aquilo com um sorriso de soslaio.

Talvez eu pudesse tirar um cochilo, afinal de contas.