AS PLANTAS ME CHAMAM DE GORDO
“Simples assim? Sem recursos, sem tchau... nada? Simplesmente “vá lá buscar” ? Ao menos é aqui perto.” – pensou ele se lembrando da terrível experiência de ter de fazer uma escolta fora do país.
O dia estava claro fora do acampamento, então não precisaria se preocupar com tempestades ou outras dificuldades impostas pela natureza. O que o preocupava era a carta do menino. Ele falava sobre experiências extraordinárias envolvendo a morte. Seria verdade? As duas opções na mente de Adam o desagradavam.
“Vou sair pra buscar um meio-sangue inexperiente que provavelmente é filho de Tânatos ou pior... de Hades. Se eu o encontrar vivo já imagino as dificuldades que não vamos enfrentar pra conseguir voltar pra casa. Que droga! Como uma criança dessas não teve um Sátiro tomando conta dela? >_<”
Sem ter mais tempo para perder, o filho de Deméter foi até seu chalé e trocou de roupa. Agora vestia sua calça de brim verde musgo e uma camiseta branca por cima. Calçava seus tênis pretos, tinha a braçadeira de conselheiro sob a manga direita, o Bracelete de Trigo no punho esquerdo, o Anel de Ceres no dedão esquerdo. Em seu bolso carregava alguns Dracmas.
“Que armas levar? Sei que ainda vou ter que carregar algo pro menino. Dois armados na volta é melhor do que 1.”
Escolheu então levar seu melhor escudo e o Cajado de Ceres. Usou um pedaço de corda feita com fibra de trigo para amarrar os dois suportes do escudo que normalmente são usados para se prender o braço e assim conseguiu colocá-lo nas costas como uma mochila, tendo a corda cruzando de forma diagonal sobre seu peito. Colocou o pequeno cajado entre as costas e o escudo, deixando-o preso pela tira de couro que geralmente se prende à mão do usuário.
“Pronto, agora é só pegar as armas extras e partir.”
Adam então saiu do chalé, que estava vazio, e rumou para a forja. Lá encontrou dois filhos de Hefesto que discutiam sobre algo que o campista não entendeu. Nunca fora bom em entender conversas picadas.
-Hey... com licença. Estou saindo para uma escolta, preciso de alguns itens pra entregar pro novato.
Eles olharam para Adam e um deles só apontou para trás com o polegar, indicando um canto escuro da forja com vários sacos de pano cheios de alguma coisa. Collins pegou um desses sacos e conferiu. Ali estavam alguns itens de proteção e uma espada curta.
-Valeu ! Tchau! - disse ele enquanto saía apressado dali.
Foi até os limites do acampamento se despedindo de alguns conhecidos no caminho. Tinha um plano. Passaria rápido pela floresta até chegar na estrada e lá chamaria o taxi das velhas, já que não encontrou aquele cara bizarro cheio de olhos pelo corpo. O caminho para a estrada foi tranquilo. Se algum monstro estava pelas redondezas acabou não percebendo Adam, que agora tirava um Dracma do bolso e jogava no asfalto para convocar as 3 bruxas. A moeda rodou dezenas de vezes no ar e quicou no chão fazendo um som agudo.
...
Nada aconteceu depois disso.
-Mas o que ? como assim?! Cadê elas ?
“Devem estar fazendo outra viagem.”
Vendo que não teria ajuda do taxi mais perigoso de NY, resolveu se adiantar e caminhar em direção à cidade. Demoraria mais tempo, embora ainda pudesse tentar o taxi no meio do caminho ou pegar um ônibus que estivesse passando por ali.
Já faziam quase 20 minutos que Adam começara a caminhada quando se viu diante de um trecho da estrada que fazia uma longa curva.
“Se isso faz uma curva eu posso tentar cortar caminho. Simples !”
Saiu da estrada e se viu dentro de mais um trecho da floresta. Pinheiros e outras árvores cercavam-no por todos os lados. O chão de terra estava seco e tinha pouca vegetação rasteira. O que mais lhe chamara atenção foi quando parou para perceber o que as árvores estavam dizendo. Elas conversavam preocupadas; era confuso mas parecia que estavam estressadas com alguma coisa. Algo sobre alguém passar por ali outra vez e de como isso era inconveniente. Adam ficou sem grassa em pensar que elas estavam falando dele. Se sentiu pior ainda quando em tom acusador uma delas disse o que na linguagem humana seria algo como “tomara que esse gordo não pise em mim”.
“Como assim GORDO?”- pensou Adam, achando engraçado e absurdo o que estava acontecendo ali.
Foi quando parou para questionar a árvore, que como sempre, percebeu que estava em uma enrascada. A uns 10 ou 12 metros depois dela, entre alguns pinheiros caminhava um enorme Minotauro.
“PUTA MERDA !” Pensou ele já se escondendo atrás da árvore mais próxima. Não teve muito tempo para observar, pois como que surgindo do nada ouviu a aproximação de algo grande vindo da sua lateral direita. Virou a cabeça a tempo de perceber um segundo Minotauro que investia em sua direção como um jogador de futebol americano. Não tinha tempo de sacar suas armas, mas seus reflexos de combate o disseram que deveria buscar a cobertura da árvore onde se escondia. Infelizmente não teve tempo o bastante; recebendo nas costas o impacto do enorme braço que o atingira como uma gigante clava de músculos e ossos. O golpe feito quase que de baixo para cima o arremessou a quatro metros de distância, fazendo-o cair de costas no chão. Se não fosse por seu escudo poderia ter a coluna fraturada naquele momento. [-40HP]
-Agh...droga ! – resmungou ele apertando os olhos devido a dor. Estivera tão distraído com a fala das plantas que nem ao menos percebeu os monstros que vagavam nos arredores.
Não teve mais tempo de se levantar do que o que foi preciso para escapar do soco que prensou a terra onde estava um segundo atrás. Ganhando dois metros de distância esticou a mão direita na direção do monstro e reuniu seus poderes divinos.
-Áro̱ma tou opíou!!!
Naquele instante flores de ópio surgiram no ar ao redor do monstro e exalaram uma fumaça verde que o envolveu. Confuso ele balançou a cabeça e os braços para todos os lados enquanto avançava tentando se desvencilhar da nuvem sobrenatural. Adam se certificou de estar fora de seu caminho enquanto percebia o quanto os movimentos do monstro ficavam mais lentos. Aproveitou para fazer surgir em sua mão livre, a Foice da Colheita; fenômeno que só foi possível graças a tatuagem mágica que fizera em sua mão.
Rodeou o inimigo afim de poder atacar seus flancos. Esperando a melhor oportunidade avançou e desferiu um golpe que lhe cortou a parte de trás da perna esquerda. O plano era o fazer cair de joelhos para então cortar-lhe a cabeça. Talvez tivesse dado certo, mas Adam percebeu que o outro Minotauro havia notado a luta e agora avançava a toda velocidade afim de acerta-lo com seus chifres mortais.
Teve de adotar uma manobra defensiva para não ser ferido novamente. Percebeu que as raízes de algumas árvores que cercavam o caminho entre o Minotauro e ele estavam expostas, o que lhe deu uma ideia.
-Rízes prokýptoun ! – gritou ele estendendo a mão livre na direção delas. Sob o comando do semi-deus as raízes estalaram e chicotearam para fora da terra. O Minotauro que corria desenfreadamente não pode evitar todas elas e acabou tropeçando. Conseguiu ainda dar três passos antes de realmente cair de peito no chão, já perto deles.
Adam atacaria o monstro ferido novamente, se ele não tivesse se virado e se preparado para atacar. Sua sorte era ele estar sobre o efeito de sua magia. Vendo a oportunidade resolveu então fazer um movimento ousado. Correu na direção do Minotauro caído logo a sua frente e saltou girando no ar de modo a cair de costas sobre ele. O movimento era parecido com um dos que Adam já vira na TV em shows de luta livre.
“Ankáthia sto kélyfos” – mentalizou ele, usando a magia Espinhos de Paineira para fazer brotar afiados espinhos de seu escudo. O impacto fez o monstro urrar de dor, tendo suas costas perfuradas em vários pontos.
Antes que pudesse ser agarrado, Adam rolou para sair dali e se levantou, recuando. Viu que o Minotauro, agora manco, avançava em sua direção enquanto o outro tentava se levantar. Furioso, ou invés de ajudar o aliado, o empurrou para que saísse de seu caminho, fazendo-o cair novamente, mas dessa vez de costas.
“ E agora ? O que eu faço?”
Vendo a oportunidade, resolveu eliminar logo um dos inimigos de uma vez. Esticou a mão esquerda em direção ao monstro caído e invocou uma nova magia:
-Gi̱ Thorn!
Foi possível ouvir um estalo na terra de baixo do Minotauro e então um grito de dor do mesmo antes que ele estourasse em pó. O monstro restante gritou furioso, o que fez a espinha de Adam tremer.
“Preciso ganhar tempo.” – pensou ele sentindo-se fraco. A magia tinha cobrado seu preço e ele agora estava quase esgotado. Felizmente conhecia um outro feitiço para o ajudar com este problema.
-Quer me pegar? Vamos brincar de correr então, coisa feia ! – afrontou.
Sem esperar mais um segundo sequer, já que o monstro já quase podia lhe alcançar com as mãos, se virou e saiu correndo. Embora estivesse ferido, Adam ficou surpreso em ver o quanto o monstro ainda era rápido.
“Correr em linha reta contra eles é loucura!” – concluiu ele fazendo a curva depois de uma árvore. O meio-sangue bruxo recorreu mais uma vez a sua energia oculta e mentalizou as palavras em grego antigo: To áro̱ma ti̱s toulípas.
Ao seu redor flores de Tulipa surgiram no ar, liberando uma fumaça azul de aroma agradável. Fumaça que Adam fez questão de inspirar o máximo possível. Foi reconfortante sentir sua energia sendo restaurada, embora com isso também tenha recebido uma fisgada de dor aguda no peito. [-20HP] Atrás dele o Minotauro ficava cada vez mais próximo, mostrando que não desistiria da perseguição. Foi aí que Adam viu três pinheiros bem próximos um do outro, formando quase que uma linha. Percebeu que entre ele havia espaço para seu corpo, mas não para o do Minotauro. Correu então até eles e ficou de frente para o monstro que avançava furioso. Adam deu um passo de ajuste para se certificar de que estava de costas para árvore da esquerda e quando o Minotauro finalmente o alcançou ele se jogou no vão entre as duas árvores, fazendo assim com que o monstro batesse com toda a força contra a árvore da esquerda. Para o azar do monstro, Adam estava em seu terreno predileto de combate. Ali na floresta ele sentia que podia se mover mais rápido, saltar mais alto... era um guerreiro melhor. Contornou então a árvore do meio, passando pelo vão dela e da árvore da direita, conseguindo assim alcançar as costas do monstros que se recuperava do choque. Ele já não estava sob o efeito da magia lançada no início da batalha, mas ainda Adam teve tempo o suficiente para saltar e segurando sua foice com as duas mãos, desferir um golpe preciso que lhe rasgou as costas profundamente. O monstro explodiu em fumaça dois segundos depois dos pés do meio-sangue tocarem o chão.
Adam estava ofegante e ferido. Sentia que a cada instante a floresta o ajudava a se recuperar. As plantas reclamavam da confusão mas sentiam-se preocupadas ao reconhecer o filho de Deméter. Percebeu então que estava sem o saco que carregava os itens que levava para o menino. Teve de voltar até onde a luta começou e viu o saco jogado perto de onde caiu depois de ser arremessado no ar. Depois disso voltou a caminhar pela floresta e atravessou aquilo que antes chamaria de atalho, chegando novamente à estrada.
-Mais uma vez...
Ele pegou um Dracma e jogou no ar. No instante em que ele tocou o chão, uma nuvem de fumaça apareceu velozmente vindo da direção da cidade e freou bruscamente em sua frente, tomando a forma de um taxi. Lá dentro estavam as horrendas bruxas que o conduziam.
-Hey, sou eu outra vez !
-Olha, é ele! Hahaha
-Entra logo, não temos tempo! – disse uma outra
-Vou para o Cen...
-Central Park – interrompeu uma delas – não é ?
-É... o.O
-Não devia.
-Por qu... AAAAAAAAAAAA !!!! – disse ele sendo interrompido novamente quando elas arrancaram com o carro fazendo-o quase perder a voz.