Depois de um longo dia de trabalho todo mundo anseia por uma longa noite de sono e descanso. É, sono e descanso... Afinal, para semideuses, nem sempre dormir é descansar. Para Lorenzo e Enzo, isso era bem a verdade deste fatídico dia de domingo que já começava com uma madrugada turbulenta para os garotos.
Eno, depois de tratar inúmeros companheiros campistas na enfermaria ao longo do dia, estava tendo um merecido descanso no chalé 6. Deixou alguns outros irmãos de plantão para cuidar dos mais feridos à noite e agora repousava em sua cama. Ao menos o seu corpo repousava. Em seus sonhos, o garoto corria com braços e pernas cortados, um arco em mãos e uma flecha de luz na outra iluminando o caminho em meio a uma floresta escura. Às suas costas ele sabia, mesmo sem ver, a localização das bestas que o seguiam. Sua audição aguçada e seus instintos semidivinos permitiam que acompanhasse cada passo das sete feras anormais. Das sete feras corrompidas por aquela escuridão insaciável. Assim que caiu no sono foi como se despencasse para aquele mundo sombrio, como se ele estivesse apenas esperando em baixo de sua consciência para tomar sua mente assim que adormecesse. Quantas horas haviam se passado? Quantos monstros já havia abatido? Animais e monstros, pessoas mutantes corrompidas por uma escuridão nociva e por uma energia verde antiga. Raposas se tornavam bestiais como lobos selvagens, ursos viravam monstros verdadeiramente aterrorizantes, massas negras de destruição, com uma fúria e uma força incomparáveis. Mais de trinta já tinham perecido no chão da floresta, com flechas de ouro, luz, fogo e ódio cravadas em suas testas, mas outros e outros surgiam para tomar seu lugar. O filho de Apolo então apenas correu e lutou pelas horas de sono à fio... Até que encontrou a clareira. A primeira clareira em meio àquelas árvores escuras e densas, e bem no centro estava uma fenda... Uma fenda no próprio ar sobre a clareira, dez metros acima do chão, para onde uma névoa negra e espessa espiralava para dentro, serpeando como uma coisa viva vinda da floresta ao redor. Ele não conseguia ver bem o que havia do outro lado da fenda mas conseguiu distinguir o brilho das estrelas no céu e, por um breve momento, pensou ter o vislumbre de um homem parado olhando para baixo em meio à névoa que saía pelo portal no ar. Mas logo desviou sua atenção pois, sentado no centro da clareira logo abaixo da fenda, estava uma sombra. Uma forma humana sentada com um braço apoiado sobre o joelho. De alguma forma Enzo sabia que era um homem, e que estava irritado.
- Que demora - A voz veio da direção da sombra. Apesar do tom baixo, Enzo conseguiu escutá-la com seus ouvidos atentos - Muito lentos. Vocês dois estão anos atrasados, porra. Vão para In Salah. Se vira.
O som dos monstros saltando sobre ele tiraram Enzo de sua distração. O guri virou-se em tempo de vê-los no ar com os olhos verdes-brilhantes e sua direção, então tudo ficou escuro.
E ainda sobre dias cansativos, Lorenzo bem sabe sobre eles. O ultimo mês estava sendo... Um inferno. Desde que anunciara a carta entregue por Mercúrio na vila principia os casos de encontro com os tais Corrompidos aumentavam a cada semana e ele estava tendo de lidar com uma enfermaria cheia de legionários feridos, enviar destacamentos de tropas para defender os arredores de são francisco, e há tempos ele não tem tempo sequer pra treinar ou malhar o ombro.
Naquela noite quando se despediu de Ahmar em sua ultima reunião tudo o que queria era deitar e dormir tranquilamente até a manhã seguinte, mas assim que pregou os olhos sentiu sua consciência afundando para além de seu corpo. Para baixo, pra um canto mais escuro que o escuro ao qual estava acostumado. Então tocou o fundo e percebeu que estava de pé sobre areia. Areia seca e macia, de grãos finos como... Um deserto. O garoto se levantou e olhou ao redor, perdido. Era noite e sem luar, e tudo estava escuro. Mal podia ver as nuvens deslizando no céu e apenas as estrelas brilhavam. Mas tudo parecia estranhamente escuro, mais escuro que o normal... No chão era como se uma névoa negra estivesse suspensa suavemente, espiralando em volta de seus pés, fluindo levemente... Mas algo parecia errado. Não pensou muito e apenas caminhou um pouco, vencendo a areia que parecia infinita no horizonte escuro. Caminhou por minutos, chegou até a correr para se aquecer na noite fria e pra passar o tempo, mas a todo momento algo o incomodava enquanto corria pelo deserto, tendo como companhia apenas o vento que soprava a areia contra seus olhos. Então notou como em um estalo o que estava o incomodando, afinal! A névoa... Ela se movia mesmo contra o vento. Na verdade o vento mal parecia afetá-la, era como se fluísse de uma direção. Virou-se e retomou sua corrida em direção ao ponto que a névoa parecia vir, e percebeu que estava certo de fato. A névoa subia e descia dunas, e ele achou que logo encontraria sua fonte mas decepcionou-se. Perdeu a noção de quanto tempo passou correndo, sem encontrar outro ser vivo sequer. Ao menos até a cabra. Ele preferia não ter encontrado a cabra. Estava correndo quando ouviu algo que não conseguiu distinguir se era um balido ou um rugido, e então seus instintos o alertaram para o ataque que vinha pela direita. Evitou-o com um salto em tempo de evitar uma cabra que passou voando por ele. Uma cabra enorme, com garras nos cascos e dentes pontiagudos. Um brilho verde homicida emanava de seus olhos, e sua pelagem era negra e maligna como a névoa no chão. A criatura atacou de novo tentando chifrá-lo e mordê-lo, então Lorenzo a deitou com um soco na cabeça e continuou sua viagem. Foi atacado por serpentes, morcegos e lagartos... Todos como a cabra; enegrecidos por alguma energia maligna, sedentos por sangue e violência. A névoa ficava cada vez mais densa, agora alcançando seus joelhos, e ele teria continuado correndo até cair se não fosse por seus instintos aguçados. Parou de correr na hora certa, a dois passos de cair na borda da fenda. Uma enorme fenda no chão, de onde vertia névoa abundantemente. Ele não conseguia ver muito do interior da fenda mas conseguiu distinguir árvores, muitas árvores, e uma floresta escura. Pensou ter visto o lampejo de uma luz dourada e um homem lá dentro, mas logo uma presença o surpreendeu.
- Um mais lento do que o outro - A voz masculina era calma e sussurrante, mas também era gélida de uma forma diferente. Uma presença firme que fez Lorenzo virar-se devagar para olhar - Você é mesmo o melhor daquele Acampamento lá? Por favor...
Uma sombra estava parada ao seu lado. A sombra de um homem, definitivamente, um homem quase da mesma altura que ele. Não emanava nenhuma hostilidade, mas parecia extremamente mal humorado.
- Preste atenção, cabeça oca filho de Ares. Vá para In Salah. É uma das portas. Ache o filho de Apolo e vá! Deem teus pulos.
Então Lonzo teve novamente a sensação de estar despencando na escuridão. Um escuro mais denso que o escuro normal, que uma noite normal.
O guri acordou em sua cama na manhã seguinte se sentindo mentalmente exausto da jornada da noite. Mas o sol começa a subir no céu e os seus companheiros já começam a se movimentar ao redor.
Eno, depois de tratar inúmeros companheiros campistas na enfermaria ao longo do dia, estava tendo um merecido descanso no chalé 6. Deixou alguns outros irmãos de plantão para cuidar dos mais feridos à noite e agora repousava em sua cama. Ao menos o seu corpo repousava. Em seus sonhos, o garoto corria com braços e pernas cortados, um arco em mãos e uma flecha de luz na outra iluminando o caminho em meio a uma floresta escura. Às suas costas ele sabia, mesmo sem ver, a localização das bestas que o seguiam. Sua audição aguçada e seus instintos semidivinos permitiam que acompanhasse cada passo das sete feras anormais. Das sete feras corrompidas por aquela escuridão insaciável. Assim que caiu no sono foi como se despencasse para aquele mundo sombrio, como se ele estivesse apenas esperando em baixo de sua consciência para tomar sua mente assim que adormecesse. Quantas horas haviam se passado? Quantos monstros já havia abatido? Animais e monstros, pessoas mutantes corrompidas por uma escuridão nociva e por uma energia verde antiga. Raposas se tornavam bestiais como lobos selvagens, ursos viravam monstros verdadeiramente aterrorizantes, massas negras de destruição, com uma fúria e uma força incomparáveis. Mais de trinta já tinham perecido no chão da floresta, com flechas de ouro, luz, fogo e ódio cravadas em suas testas, mas outros e outros surgiam para tomar seu lugar. O filho de Apolo então apenas correu e lutou pelas horas de sono à fio... Até que encontrou a clareira. A primeira clareira em meio àquelas árvores escuras e densas, e bem no centro estava uma fenda... Uma fenda no próprio ar sobre a clareira, dez metros acima do chão, para onde uma névoa negra e espessa espiralava para dentro, serpeando como uma coisa viva vinda da floresta ao redor. Ele não conseguia ver bem o que havia do outro lado da fenda mas conseguiu distinguir o brilho das estrelas no céu e, por um breve momento, pensou ter o vislumbre de um homem parado olhando para baixo em meio à névoa que saía pelo portal no ar. Mas logo desviou sua atenção pois, sentado no centro da clareira logo abaixo da fenda, estava uma sombra. Uma forma humana sentada com um braço apoiado sobre o joelho. De alguma forma Enzo sabia que era um homem, e que estava irritado.
- Que demora - A voz veio da direção da sombra. Apesar do tom baixo, Enzo conseguiu escutá-la com seus ouvidos atentos - Muito lentos. Vocês dois estão anos atrasados, porra. Vão para In Salah. Se vira.
O som dos monstros saltando sobre ele tiraram Enzo de sua distração. O guri virou-se em tempo de vê-los no ar com os olhos verdes-brilhantes e sua direção, então tudo ficou escuro.
E ainda sobre dias cansativos, Lorenzo bem sabe sobre eles. O ultimo mês estava sendo... Um inferno. Desde que anunciara a carta entregue por Mercúrio na vila principia os casos de encontro com os tais Corrompidos aumentavam a cada semana e ele estava tendo de lidar com uma enfermaria cheia de legionários feridos, enviar destacamentos de tropas para defender os arredores de são francisco, e há tempos ele não tem tempo sequer pra treinar ou malhar o ombro.
Naquela noite quando se despediu de Ahmar em sua ultima reunião tudo o que queria era deitar e dormir tranquilamente até a manhã seguinte, mas assim que pregou os olhos sentiu sua consciência afundando para além de seu corpo. Para baixo, pra um canto mais escuro que o escuro ao qual estava acostumado. Então tocou o fundo e percebeu que estava de pé sobre areia. Areia seca e macia, de grãos finos como... Um deserto. O garoto se levantou e olhou ao redor, perdido. Era noite e sem luar, e tudo estava escuro. Mal podia ver as nuvens deslizando no céu e apenas as estrelas brilhavam. Mas tudo parecia estranhamente escuro, mais escuro que o normal... No chão era como se uma névoa negra estivesse suspensa suavemente, espiralando em volta de seus pés, fluindo levemente... Mas algo parecia errado. Não pensou muito e apenas caminhou um pouco, vencendo a areia que parecia infinita no horizonte escuro. Caminhou por minutos, chegou até a correr para se aquecer na noite fria e pra passar o tempo, mas a todo momento algo o incomodava enquanto corria pelo deserto, tendo como companhia apenas o vento que soprava a areia contra seus olhos. Então notou como em um estalo o que estava o incomodando, afinal! A névoa... Ela se movia mesmo contra o vento. Na verdade o vento mal parecia afetá-la, era como se fluísse de uma direção. Virou-se e retomou sua corrida em direção ao ponto que a névoa parecia vir, e percebeu que estava certo de fato. A névoa subia e descia dunas, e ele achou que logo encontraria sua fonte mas decepcionou-se. Perdeu a noção de quanto tempo passou correndo, sem encontrar outro ser vivo sequer. Ao menos até a cabra. Ele preferia não ter encontrado a cabra. Estava correndo quando ouviu algo que não conseguiu distinguir se era um balido ou um rugido, e então seus instintos o alertaram para o ataque que vinha pela direita. Evitou-o com um salto em tempo de evitar uma cabra que passou voando por ele. Uma cabra enorme, com garras nos cascos e dentes pontiagudos. Um brilho verde homicida emanava de seus olhos, e sua pelagem era negra e maligna como a névoa no chão. A criatura atacou de novo tentando chifrá-lo e mordê-lo, então Lorenzo a deitou com um soco na cabeça e continuou sua viagem. Foi atacado por serpentes, morcegos e lagartos... Todos como a cabra; enegrecidos por alguma energia maligna, sedentos por sangue e violência. A névoa ficava cada vez mais densa, agora alcançando seus joelhos, e ele teria continuado correndo até cair se não fosse por seus instintos aguçados. Parou de correr na hora certa, a dois passos de cair na borda da fenda. Uma enorme fenda no chão, de onde vertia névoa abundantemente. Ele não conseguia ver muito do interior da fenda mas conseguiu distinguir árvores, muitas árvores, e uma floresta escura. Pensou ter visto o lampejo de uma luz dourada e um homem lá dentro, mas logo uma presença o surpreendeu.
- Um mais lento do que o outro - A voz masculina era calma e sussurrante, mas também era gélida de uma forma diferente. Uma presença firme que fez Lorenzo virar-se devagar para olhar - Você é mesmo o melhor daquele Acampamento lá? Por favor...
Uma sombra estava parada ao seu lado. A sombra de um homem, definitivamente, um homem quase da mesma altura que ele. Não emanava nenhuma hostilidade, mas parecia extremamente mal humorado.
- Preste atenção, cabeça oca filho de Ares. Vá para In Salah. É uma das portas. Ache o filho de Apolo e vá! Deem teus pulos.
Então Lonzo teve novamente a sensação de estar despencando na escuridão. Um escuro mais denso que o escuro normal, que uma noite normal.
O guri acordou em sua cama na manhã seguinte se sentindo mentalmente exausto da jornada da noite. Mas o sol começa a subir no céu e os seus companheiros já começam a se movimentar ao redor.