Quando fui chamado para a casa grande não pude deixar de erguer as sobrancelhas. Não em ironia, mas em genuína surpresa. "Quíron sabe quem sou eu?", me surpreendi. Havia tantos campistas, e tantos deles mais fortes e experientes, que não passava pela minha cabeça que seria chamado para uma missão.

E se não for uma missão? Porra, descobriram que eu roubo comida da cozinha de madrugada?

Aflito, suspiro enquanto interrompo minha leitura matinal. Nas mãos, um dos livros do acampamento com os mitos gregos mais comuns. Eu honestamente não entendia nada daquele mundo ainda, só que conhecimento e poder eram 99% de minha vida agora.

Confiro no espelho do banheiro do chalé se estava apresentável antes de ir para a casa-grade, com Julia voando pro meu ombro logo ao sair. Aquela corvinha sempre estava pelas redondezas, caçando morangos maduros enquanto os filhos de Deméter não viam e coxas de frango do refeitório, o que me fazia achá-la divertida. Foi com a companhia dela que entrei na casa-grande, surpreendendo-me que não fui o único a ser chamado. Surpreendendo-me mais ainda, na verdade, quando vi aquela garota de cabelos negros e longos e com uma cara de profundo desinteresse eterno. Como era o nome? Clara? Sei lá. Só sabia que era uma das mais antigas no chalé de Hades. A outra tinha uma aura tão sinistra quanto. Somos os três filhos de Hades?, me perguntei confuso, passando o dedo por baixo das penas de Julia distraído.

Enquanto o centauro falava eu prendo o riso, tentando manter-me neutro. Eu estava achando aquela história um tanto quanto engraçada. gostaria de poder comentar que parecia que estávamos sendo escalados pra um filme de terror. Qual o próximo passo? Nos hospedar em um hotel abandonado na beira da estrada? Alugar uma casa com 47 assassinatos no histórico.

Foi no fim que perdi minha vontade de rir. Passagens de avião? Mas todos diziam que nós em particular não deveríamos viajar de avião ou de navio por nada. A birra dos deuses. Um perigo maior. Preocupo-me com este detalhe, mas não ouso me pronunciar. Se duas filhas de Hades mais experientes não reclamassem, por que eu deveria?

Olho pra elas. Um pouco nervoso, um pouco desgostoso. Eu era sem jeito e timido demais pra buscar amizade com meus irmãos, mas estava curioso com o que aqueles mais fortes que eu poderiam fazer. O que eu poderia aprender? Especialmente numa missão estranha como aquela aparentava que seria; afinal, fosse o que fosse, tinha sequestrado uma-das-semideusas-mais-poderosas-que-quíron-conhecia, segundo a concepção dele próprio.

Aguardo alguma manifestação daqueles com voz, e ouço atentamente.

Nível 5 - Príncipe da Carniça: Shouto sempre foi solitário, mas adorou a companhia das criaturas da noite, desenvolvendo um vinculo especial com elas, sobretudo os símbolos de seu pai: os corvos, os quais o adoram e costumam estar sempre presentes para admirá-lo e bater papo. Consegue comunicar-se, comandar e adentrar a mente destes animais, controlando-os com sua vontade. A influência do garoto não pode forçar os corvos a fazer coisas que vão contra seu sento se auto-preservação, como se matar etc, mas deve ser levado em conta a fidelidade e determinação dos animais em ajudá-lo.

A convocação havia sido uma grande surpresa para mim. Obvio que aquilo aconteceria no último dia em que minhas irmãs estavam no chalé, por 24 horas fico atada a um grupo de campistas qualquer. Quando entrei na sala da Casa Grande vi meus companheiros de missão, minha irmã “mais velha” Clare, e outro guri que pela cara de pálido também deveria ser meu irmão. Revirei os olhos ao ver o macho, por que raios Quíron insistia em me jogar em missões com homens. Ouço as instruções do velho centauro, que parecia estar ficando velho de mais para conduzir o acampamento, se os tremores em sua mão indicavam qualquer coisa.

Óbvio que iriamos de avião. Três filhos de Hades, andando pelo território de Zeus, o que poderia dar errado? Solto um muxoxo de impaciência quando ouço que aquele seria nosso meio de transporte, e dou um olhar de relance para Clare.

Ao término, decido perguntar algumas coisas básicas.

- Alexandra é descendente de quem? - pergunto, já imaginando que não seria de Atena, afinal ela havia decidido morar no continente antigo. - Esse namorado… - faço uma cara de desgosto – Também é um semideus? Você sabe se ela havia algum inimigo declarado?

Espero que minha irmã complemente minhas perguntas, e que o garoto fique de boca fechada enquanto resolvemos a situação.

Shouto resolve ficar quieto () enquanto as outras duas filhas de Hades fazem as perguntas para Quiron.

- Alexandra é descendente de quem? -Pergunta Sophie.

-De Poseidon, uma das mais velhas. -Responde o diretor.

-Esse namorado também é um semideus? Você sabe se ela havia algum inimigo declarado? -Rebate a garota, parecia que ela estava se preparando para caçar.

-Não, o Bill é um mortal com uma sensibilidade para enxergar através da névoa, nada demais. E bom, semideuses sempre tem inimigos ao longo de suas vidas, por isso não duram tanto... quer dizer... cof cof.

-Conseguiria dizer em que nível estariam inimigos que pudesse deixar ela dessa maneira? -Pergunta a Clare depois de Sophie fazer todas aquelas perguntas.

-Não faço ideia, ela é mais forte que Tideborn e já lutou contra alguns seres colossais em sua vida, mas eu nunca soube de nada que a deixasse com tanto medo.

Escuto o diálogo das garotas com Quíron, satisfeito de ficar calado

Dou uma volta pela sala. Espio os livros nas estantes, a lareira crepitando, a cabeça de um leopardo na parede, o que me parecia uma decoração bem punk, levando em conta que a cabeça parecia viva.

Aparentemente eu estava mesmo sendo convocado para uma missão suicida. Uma pergunta me vem à mente. Antes que as outras duas filhas de Hades tenham oportunidade de continuar seu interrogatório, eu olho pra Quíron e estalo a lingua para chamar sua atenção. Olho significativamente para minhas irmãs e então aponto pra elas e pra mim e levanto as mãos questionando "por que"? Bom... Não acreditava que tinha sido simples coincidência ele ter chamado três filhos de Hades. Teria o centauro alguma ideia do nos esperava e adaptou o grupo para lidar com aquilo, embora não falasse, ou havia sido apenas uma infeliz coincidência? Aquilo estava me coçando na cabeça, e sentia que devia perguntar.

Caso o centauro não entenda a pergunta eu suspiro tristemente. Olho pra Julia, pedindo-lhe que traduzisse meus pensamentos, que me emprestasse seus sentidos e sua voz. Assim, através da mente da corva eu estalo o bico e complemento;

- Crak! Por que nós três?

Dou de ombros diante da resposta, qualquer que seja. No fim, era somente uma missão. O sucesso e a falha eram os dois destinos ao fim daquela jornada, e eu esperava que não desse muito trabalho chegar até lá, qualquer que fosse o resultado.

Nível 5 - Príncipe da Carniça: Shouto sempre foi solitário, mas adorou a companhia das criaturas da noite, desenvolvendo um vinculo especial com elas, sobretudo os símbolos de seu pai: os corvos, os quais o adoram e costumam estar sempre presentes para admirá-lo e bater papo. Consegue comunicar-se, comandar e adentrar a mente destes animais, controlando-os com sua vontade. A influência do garoto não pode forçar os corvos a fazer coisas que vão contra seu sento se auto-preservação, como se matar etc, mas deve ser levado em conta a fidelidade e determinação dos animais em ajudá-lo.

Estava receosa pela resposta que Quíron me daria, e ao ouvir que Alexandra era mais forte que Tide sinto vontade de voltar para minha cama e encarar meus pesadê-los. Eu nunca tinha conhecido pessoalmente, mas qualquer um naquele acampamento já tinha ouvido falar dos semideuses mais poderoses de cada chalé, e Tide era o de Poseidon. Me lembro de minhas últimas missões com Lhokita, a semideusa mais forte com que eu já tive contato, e penso que aquela missão teria um nível tão equivalente quanto.

Mas pelo menos tínhamos descobrido algumas coisas:
- Alexandra é uma filha de Poseidon, as vezes procurar por inimigos desse deus nos traria alguma pista
- Ela já tinha lutado contra seres colossais. Eu não tenho muita experiência com eles, mas acho que não é fácil pra nenhum semideus, então talvez pudesse ser algum desse tipo que tivesse voltar para assombrá-la.
- Risada maléfica e peculiar do inimigo que havia encontrado ela. Dou uma repassada mental nas coisas que já havia aprendido sendo serva de Éris que pudesse se encaixar naquele padrão.

Vejo Shouto mexer as as mãos e seguro a risada. O que era isso? Não pera, ele não estaria fazendo gracinha na frente de Quíron sendo um recém chegado. Se fosse ele seria meu mais novo xodó.
Depois de terminarem as perguntas complemento:

-- Bom, acho que o resto podemos perguntar para esse tal de Bill, afinal tudo que Quíron tem é uma mensagem de socorro e um a mensagem de voz. -- Digo aos meus irmãos -- Agora nós precisamos ver como chegaremos à londres... Quem mais viaja pelas sombras?

---

Inteligência: Os Servos de Éris sempre pensam na melhor forma de causar o caos e a discórdia, sem que as consequências cheguem a eles.

Mente Caótica III: Servos de Éris possuem uma mente caótica, pensando em vários planos e estratégias ao mesmo tempo. Também, em combate, pode ter uma ampla visualização dos acontecimentos ao seu redor.

Sinto um leve calafrio passar por minha espinha, e amaldiçoo mentalmente minha má sorte de estar no acampamento naquele momento. Kristen já havia comentado mais de uma vez sobre seu irmão, Tideborn, e suas histórias não deixavam margem de erro. O garoto era forte, se Alexandra era mais forte e estava aterrorizada, o monstro que estava lhe perseguindo seria implacável. Fico emersa em meus pensamentos, tentando lembrar qualquer informação que fosse útil, e olho momentaneamente pro chão.

Quando percebo, Shouto estava fazendo gestos com a mão em nossa direção, e em seguida seu corvo grana uma pergunta. Deixo o queixo cair levemente, fazendo uma careta incrédula, o garoto era um completo imbecil ou o que? Olho com desprezo para o garoto, e em seguida Clare toma a fala novamente,

- Concordo, irmã… Ainda não desenvolvi essa habilidade, acho… - engulo em seco rapidamente – Acho que precisaremos das passagens áreas afinal… E de um sacrifício para Zeus.

Éramos três filhos de Hades, indo salvar uma filha de Poseidon, passando pelos céus. Se eu tivesse que caçar uma corça inteira e queimá-la na fogueira eu faria isso. Caso todos já tenham terminado com suas perguntas, e Quíron não queria nos informar sobre mais nada, digo:

- Vou pegar meus equipamentos, irmã. Lhe vejo no Pinheiro?

Sem dirigir a palavra a Shouto, vou pegar minhas tralhas.

Pelas reações das garotas à menção de Tideborn, percebo que eu falhava mais uma vez em minha tarefa diária de buscar informação. Quem era aquele, afinal?

Trabalho em ignorar as reações à minha simplória forma de comunicação improvisada enquanto encaro Quíron em busca de uma resposta. Mas enquanto faço isso, minha mente viaja pelo acampamento em busca de corvos que estivessem voando nos bosques, caçando peixes nos lagos, descansando sobre o telhado da propria Casa Grande. Deixo-os alerta, avisando que talvez precisasse de seus serviços em alguns minutos.