Ela só quer ir para casa.
Era difícil ser mulher no seu mundo. Em qualquer um dos mundos. As mulheres não nasciam valorizadas. Não pareciam herdeiras naturais perante à natureza. Ou era esse somente a visão machista da humanidade perante ao mundo? Não importa.
O que importa era que ser mulher significava ter de superar a si mesma todos os dias. Todas as coisas que faziam os homens rir. Como caminhar com sapatos bonitos e desconfortáveis. Sangrar todo mês. Cólicas infernais. Ter de demorar tanto tempo ao usar o banheiro. Carregar, no ventre, a mais sincera manifestação de vida.
E talvez o mundo inteiro não saiba muito sobre as mulheres, e nem elas sobre si mesmas.
Mas sabem que é importante na vida, não necessariamente ser forte. Mas sentir-se forte. Se avaliar uma vez na vida. Se encontrar, pelo menos uma vez, na mais antiga condição humana. Encarando a cegueira, ficando surdo. Com nada mais para te ajudar além de suas mãos e a própria cabeça.
E Nora havia vencido tudo isso.
E se sentia bonita.
Bonita aos olhos do Criador. Bonita aos olhos daquela mulher, que sequer conhecia o nome, mas que já parecia ser mais grata a ela do que qualquer palavra poderia exprimir.
E Nora Al-Rashid não precisou de um homem para isso.
-
O nome dela era Elisheva.
Ou Elizabeth, em inglês. Assim que entraram à casa modesta do subúrbio, Nora sentiu-se leve. Leve como se sentia quando sua mãe cantava para ela, ou lia o livro sagrado. Leve como quando o filho de Elisheva, Abdullah, falou com ela. Leve como quando o seu próprio pai tocou-a com a ponta de seus dedos, em forma de raios solares.
A mulher mostrou-lhe o quarto do filho.
- Ele disse-me que esperávamos visita. Por isso, preparou tudo.
E, de fato, preparou. O lugar era, quase que exatamente, como o que Nora dormia, na Síria. Só faltavam as armas, o cheiro de suor pela quantidade enorme de pessoas, e a sua mãe. Mas, assim que colocou os pés dentro dos limites do quarto, sentiu-se em casa.
- Talvez eu possa ajudar. Mas amanhã. Descanse, ok? Preciso telefonar.